Saidiya Hartman é a primeira autora confirmada na 20ª edição da Flip

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A Flip – Festa Literária Internacional de Paraty, que será realizada de 23 a 27 de novembro de 2022, na cidade de Paraty, anuncia o primeiro nome de sua programação. Escritora e professora de literatura comparada na Universidade Columbia, Saidiya Hartman é uma importante expoente do pensamento negro contemporâneo e desenvolve pesquisas nos campos da história da escravidão e literatura afro-americana. Por seu trabalho, já recebeu diversas distinções acadêmicas e bolsas de pesquisa, como a MacArthur “Genius Grant”, Guggenheim e Fulbright.

“Hartman, assim como Bernardine Evaristo, nossa convidada em 2021, fazem parte de uma geração de autoras que, como lembra Audre Lorde, se recusam a usar definições fáceis de negritude’. Para uma festa que celebra a literatura, um projeto estético como o de Hartman tem muito a contribuir na discussão sobre o que, no contato com a leitura, pode tornar-se visível, e para quem”, comenta o diretor artístico da Flip, Mauro Munhoz.

Sua obra se desloca entre as fronteiras da história e da imaginação para, a partir da leitura de arquivos, refletir sobre as vozes ocultas da escravidão. “Desde o primeiro encontro com a história colonial oficial, somos levados a um conjunto de imagens que narram e naturalizam as relações violentas da escravização de pessoas negras. A escrita de Saidiya Hartman costura linguagem e fatos históricos com uma criatividade impressionante, o que faz a sua obra ser um poderoso modo de ‘desabitar’ e ressignificar essas narrativas.”, destaca uma das curadoras da 20ª edição da Flip, Milena Brito. A também curadora Fernanda Bastos acrescenta: “A vinda dessa escritora nos anima porque Saidiya Hartman tem apontado novos caminhos para a historiografia da Diáspora Africana”.

Saidyia tem três livros já traduzidos no Brasil. Perder a mãe (Bazar do Tempo, 2019) publicado originalmente em 2006, em que conta, em primeira pessoa, sua jornada de pesquisa a Gana para retraçar a rota comércio atlântico de escravos. Sua abordagem original da história da escravidão, que se entrelaça com a busca pessoal de sua própria ancestralidade, chamou atenção da crítica. Fernanda Bastos ressalta “Articulando narrativa e teoria, ela transita de forma inventiva pelos arquivos oficiais, pela literatura, pela fotografia e pelo audiovisual, notabilizando as formas de sobrevivência encontradas no período de escravização e os caminhos trilhados com rebeldia e insubmissão por pessoas a quem a liberdade não foi desde sempre garantida”.

No recém-publicado Vidas rebeldes, belos experimentos (Fósforo, 2022), a autora estuda a população dos cinturões negros da Filadélfia e de Nova York através de trajetória de jovens negras que se rebelaram contra seu tecido social. A combinação entre um estilo literário e o rigor acadêmico na pesquisa de fontes lhe rendeu o National Book Critics Circle Award. Saidiya também assina os ensaios O fim da supremacia branca, a edição comemorativa de O cometa (Fósforo, 2019), do sociólogo norte-americano W.E.B. Du Bois, e Vênus em Dois Atos, publicado em Pensamento negro radical (Crocodilo/N-1 edições) e se prepara para lançar Cenas de sujeição (Crocodilo).

Nas palavras de Pedro Meira Monteiro, do coletivo curatorial da festa, “Que este seja o primeiro nome anunciado nesta Flip é significativo”. Com essa escolha, a Flip reforça sua missão de pontes entre as diversas formas de arte e conhecimento, criando um espaço de reflexão sobre o mundo. Depois de dois anos de medidas restritivas devido à pandemia de Covid-19 e do consequente aprofundamento das desigualdades sociais no mundo, a obra de Saidyia permite pensar sobre os diversos silenciamentos deixados em nossa história. Ao mesmo tempo, mostra a potência da interdisciplinaridade e do intercâmbio de visões como forma de trazer à tona as diversas vozes que formam as nossas sociedades, no passado e no presente.

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Foto: Steven Gregory